sábado, 10 de agosto de 2013

Especialistas afirmam que Lei 12.846 veio em boa hora, mas é preciso fiscalizar

Foto de Adailson Calheiros
Advogado e economista, Pedro Guido diz que lei veio em boa hora
Olívia de Cássia – Repórter

A Lei Federal 12.846, também chamada de Lei Anticorrupção Empresarial, que endurece as regras para punição de empresas envolvidas em atos contra a administração pública, está sendo avaliada como uma boa iniciativa pelos representantes dos movimentos sociais alagoanos, mas eles observam que é preciso ter mecanismos para fiscalizar a sua aplicação.

Sancionada pela presidente Dilma Rousseff no dia 1º, e publicada no Diário Oficial da União do dia 2 de agosto, a lei foi concebida pela Controladoria-Geral da União (CGU) e pelo Ministério da Justiça. O Projeto de Lei estava tramitando no Congresso Nacional desde 2009 e só agora foi aprovado e sancionado com três vetos de Dilma.

“A lei cria novos mecanismos de responsabilização de pessoas jurídicas, nas esferas civil e administrativa, mas não altera, contudo, a legislação criminal”, observa Pedro Guido, diretor-presidente do Instituto Silvio Viana.  As  empresas ficam passíveis de multas de até 20% de seu faturamento bruto (ou de até R$ 60 milhões, caso o faturamento não possa ser calculado), dependendo da gravidade e dos valores envolvidos nas infrações.

 Para o diretor presidente do Instituto Silvio Viana, que é economista e advogado, muitas entidades alagoanas poderão ser atingidas por essa lei: “Ela veio em boa hora e a gente tem que aplaudir”. Segundo ele, antes era assim: a empresa que fraudava a administração pública ficava sem poder fazer empréstimo em banco oficial, não podia receber subsídio, mas podia criar outra empresa com laranja e fazer outra licitação, ia para um cadastro de empresa inidônea”, explica.

Integrante do Focco\AL (Fórum Contra a Corrupção de Alagoas), Pedro Guido observa que havia uma cobrança da Organização de Cooperação da Comunidade Econômica (OCDE), que cobrava do Brasil essa lei, porque nos países desenvolvidos todos já possuem a legislação. “Era inadmissível que num grande caso de corrupção, a empresa não pudesse ser penalizada de uma forma direta”, destaca.

Ele pontua que atualmente há uma dificuldade para se conseguir o faturamento bruto da empresa, mas não sendo possível, com a nova lei, pode ser aplicada uma multa que varia de seis mil a 60 milhões. Com um detalhe: normalmente quem aplicava a multa, nesses casos de corrupção, era o Poder Judiciário. “Essa lei veio revolucionar isso, quem aplica a multa será um processo administrativo”, explica.

Na avaliação do presidente do ISV, a Lei Federal 12.846 vai interferir na questão da corrupção empresarial, “porque ela veio quebrar essa história de que só quem era punido era o “pé descalço”. Mas ele destaca que para a lei ser cumprida é necessário fiscalizar a sua aplicação,  porque, segundo ele, sem fiscalização e sem controle, nada funciona.

  “O que eu quero chamar a atenção é que o mais importante é prevenir: é como na saúde. “Ao invés de curar a doença você evita que a empresa adoeça”, argumenta.

Pedro Guido lembra que a lei federal vai pegar uma parte que nunca foi questionada e punida que é a empresa. “É necessário combater a corrupção com muita força, porque são tantos os casos que os órgãos que combatem e controlam, interna ou externamente, não têm condições de chegar onde estão todos os casos de corrupção: é impossível”, diz ele.

Dinheiro que sai da corrupção volta
muito pouco para cofres públicos

Foto de Luciana Martins-Primeira Edição
Economista Luciana Caetano  
A reportagem da Tribuna Independente ouviu a economista Luciana Caetano da Silva, professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade Federal de Alagoas, e ela fez um comparativo afirmando que nas seis operações da Polícia Federal do Estado que foram selecionadas pela reportagem para que ela fizesse uma avaliação, o montante desviado nessas operações ultrapassou o orçamento de algumas secretarias do Estado.

Em 2006, a Secretaria Executiva de Turismo realizou uma despesa de R$ 2 milhões, enquanto em 2005 a operação Gabiru denunciou um desvio de R$ 2 milhões.  Em 2007, o Estado de Alagoas realizou uma despesa de R$ 344,4 milhões na educação, por intermédio da Secretaria de Estado da Educação e do Esporte.  A Secretaria de Estado da Saúde realizou uma despesa de R$ 131,2 milhões. No mesmo ano, a operação Taturana denunciou um desvio de R$ 300 milhões e a operação Carranca, um desvio de R$ 5,5 milhões.

Segundo a economista, em 2013, os municípios de Tanque D’Arca, Piaçabuçu, União dos Palmares e Porto Real do Colégio, foram responsáveis pelo desvio de R$ 10 milhões. Esse valor corresponde ao orçamento das Secretarias de Estado do Trabalho e da Assistência Social, em 2012, cada uma com um orçamento R$ 5,2 milhões. Total do desvio identificado: R4 317,5 milhões, que poderiam ser aplicados em políticas públicas, de assistência aos menos favorecidos.

“O custo da corrupção, portanto, se reflete no número de pessoas que morrem sem atendimento médico, na elevada taxa de analfabetismo, na taxa de mortalidade infantil, no índice de extrema pobreza e nos diversos outros gargalos que comprometem o projeto de desenvolvimento em bases sustentáveis”, observa Luciana Caetano.

Segundo a professora, os desvios não se resumem aos casos citados acima. Ainda têm outros,  outros municípios que tratam corrupção como um instrumento legal para elevação do patrimônio pessoal e dos ativos políticos.

Ainda sobre os desvios, Pedro Guido destaca que o dinheiro que sai da corrupção volta muito pouco para os cofres públicos:  “Cerca de 5%. É difícil recuperar, até o dinheiro que vai para o exterior, para repatriá-lo é uma dificuldade; se for para um paraíso fiscal, acabou, porque o dinheiro entra e sai lá, sem nenhum controle”, explica.

Segundo o presidente do Instituo Silvio Viana, a sociedade precisa se organizar, se capacitar e começar a ditar, conforme está na Constituição, “se organizar para exercer o poder, dentro da ordem. Isso é a participação popular e o controle social: é isso que eu defendo”, diz ele.

Segundo Guido, se a aplicação da Lei Federal 12.846 vai acontecer, ou não, vai depender dos órgãos que controlam: Ministério Público (MPE e MPF), Tribunal de Contas da União (TCU); Polícia Federal (PF); Controladoria Geral da União e o Ministério Público de Contas (MPC), mas, segundo ele, essas instituições padecem da falta de estrutura. “Eles têm problema da falta de pessoal, estão aparelhados de conhecimento, mas de pessoal, não. Por isso que é importante a fiscalização, vai ser difícil”, destaca.

Ministério Público Estadual

A Tribuna Independente tentou contato com o Ministério Público Estadual (MPE) para uma avaliação sobre a Lei 12.846, a Lei Anticorrupção Empresarial, mas os seis promotores integrantes do Grupo de Trabalho de Combate à Improbidade Administrativa em Alagoas estão em São Paulo participando do curso ‘Investigação Financeira na Defesa do Patrimônio Público.

Quando voltarem do curso, os promotores José Carlos Castro, coordenador do grupo, Jorge Bezerra, Napoleão Franco, Tácito Yuri, Karla Padilha e Fernanda Moreira vão analisar mais de 300 casos de atos de improbidade administrativa no Estado.

VETOS
Os três vetos da presidente Dilma ao projeto foram positivos, porque os fraudadores “vão pensar duas dúzias de vezes antes de cometer a corrupção”, observa Pedro Guido. Ele destaca ainda que todos os vetos evitam brechas para punições mais brandas a empresas envolvidas em irregularidades.

O principal deles derruba um dispositivo que impedia a aplicação de multas acima do valor do serviço contratado. “Assim, uma empresa poderia cometer uma série de irregularidades em um contrato de R$ 100 mil, e a multa não poderia exceder esse valor.

 Com a derrubada do veto, fica garantida a possibilidade de multa equivalente a 20% do faturamento bruto”, argumenta. A presidente Dilma também derrubou pontos que exigiam a comprovação de dolo da empresa, que é incoerente com o espírito de responsabilização objetiva da lei. “Para comprovar o dolo, teria que ser provado a intenção de pessoa jurídica, o que é impossível”.

Outro ponto vetado pela presidente possibilitava atenuar sanções contra a empresa, dependendo do grau de contribuição do servidor público para a fraude. “Como sempre ‘o descalço’ é quem pagaria. Agora ele vai responder a outro processo (disciplinar) ou ter que ressarcir o dano que causou, mas não fica com a responsabilidade maior como vinha acontecendo”, esclarece.

MCCE diz que lei é salutar para o país
e é fruto das mobilizações

Foto: Sandro Lima
Para Adriano Argolo, coordenador jurídico do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral de Alagoas (MCCE\AL), a aprovação da Lei 12.846 e de outras que vêm sendo aprovadas, são fruto do trabalho que o movimento vem fazendo, com efeitos positivos, por meio das mobilizações da sociedade.

“Eu sempre digo que é fruto do trabalho do movimento; reflete a luta que educou a sociedade a criar uma massa crítica no país, com relação às irregularidades. Avalio como salutar para o país, pois essa lei vai dificultar a corrupção; ela é fruto da pressão internacional, vai dar mais transparência, controle externo do Judiciário”, observa.

Argolo destaca que a lei sancionada pela presidente Dilma é uma colcha de normas positivas e que as instituições precisam ser transparentes. “A lei mexe com a questão da punição mais rigorosa e com o bolso dos corruptos”, ressalta.

O coordenador jurídico do MCCE também observou que o deputado João Henrique Caldas (JHC-PTN) foi muito inteligente nas denúncias que fez contra  a Mesa Diretora da Assembleia e foi buscar na Justiça a solução. O deputado pediu e recebeu autorização da Justiça Federal para o acesso aos extratos bancários da Assembleia Legislativa, via Caixa Econômica Federal.

 “A Assembleia já tinha se recusado diversas vezes a prestar contas (a respeito de empréstimos e gastos, funcionários fantasmas, entre outras denúncias), mas o deputado solicitou via Justiça a entrega de documentos, de depósitos suspeitos – de valores exorbitantes – a servidores da Casa de Tavares Bastos. Avalio que essa lei é um avanço”, pontuou Argolo.

Antônio Fernando da Silva (Fernando CPI), fundador e coordenador geral do MCCE no Estado, observa que “toda legislação que vier para fortalecer a luta contra a corrupção, e todos os seus aspectos, será muito bem-vinda. Agora caberá à população e à sociedade civil cobrar e exigir a aplicação dela”, destacou.


Num segundo momento, “cremos na total aplicabilidade da lei, pois a legislação tem que ser mais severa para brecar o ralo da corrupção no Brasil; a sociedade pode ter certeza que o MCCE, não só em Alagoas, mas em todo o Brasil, estará vigilante sobre essa questão”, pontua.

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