segunda-feira, 13 de junho de 2016

Um dia de interrogações

Por Olívia de Cássia

Sabe Diário, hoje o dia foi de introspecção; interrogações; leitura, cansaço, sono, de lembranças, - algumas cheias de saudades -. O que me preocupa, Diário, é que eu não quero ficar pensando no que virá, na situação que me espera daqui para frente, mas é impossível não pensar e não ficar preocupada.

As lembranças de papai, do sofrimento pelo qual ele passou e de meu irmão Petrônio são muito presentes em mim, em cada pequeno gesto meu. E quando me indagam quando é que eu comecei a sentir os sintomas da ataxia, eu nem sei mais dizer, faz tanto tempo!

Mas a piora mesmo aconteceu de uns anos para cá, embora que moderadamente mais atrás, e mais rapidamente do ano passado para cá. Percebi que não consigo mais subir numa cadeira para pegar algo na estante de livros; isso aconteceu este ano.

Até dezembro do ano passado,  mesmo com sacrifícios, eu ainda conseguia lavar o piso da casa, mesmo com medo de escorregar e cair. Este ano fui percebendo que as limitações aumentaram, consideravelmente.

Aos poucos fui tendo a certeza de que precisava de ajuda, de socorro para ter um pouco mais de qualidade de vida e felizmente um grupo de amigos se mobilizou e empunhou essa bandeira. Sou eternamente grata a todos pela força e incentivo que me proporcionaram.

No começo eu não queria aceitar, com vergonha do que pudessem achar, mas depois cedi. Mas não quero ficar deprimida de novo; no entanto, tem momentos que é necessário a gente se abrir e falar de coisas ao vento.

Hoje eu pensei que seria melhor que eu tivesse chorado muito, como antigamente, que eu me derretia por qualquer situação e tivesse colocado todas as minhas inquietações e questionamentos para fora, num desabafo particular.

Mas até isso a ataxia tira da gente: a sensibilidade e a fragilidade parece que vai sumindo da gente. Vai nos endurecendo aos poucos e nos torna mais cética diante dos problemas da vida. Talvez essa seja um proteção que o próprio cérebro vai encontrando, para nos proteger de alguma forma.

Hoje eu não senti muitas dores e cheguei na fisioterapia mais animada e disposta, mas quando cheguei em casa, um misto de preocupação e inquietação tomou conta de mim: não preparei almoço e fui me deitar. Dormi até o meio da tarde, quando levantei e fiz uma besteira para comer, mesmo assim, sem muito gosto e vontade.

Essa sensação não é nova para mim; costuma me acontecer quando estou pressentindo algum acontecimento ou quando preciso escrever urgentemente e colocar alguns sentimentos para fora. Se não o fizer, morro sufocada pelas palavras que teimam em sair.

Tenho consciência de que não posso me fechar em copas e guardar para mim todas as minhas preocupações e expectativas; é melhor desabafar com alguém e o Diário, meu amigo de tanto tempo, é o meio mais indicado.

Não sou muito de guardar sentimentos e às vezes avalio que me exponho até demais na vida. Isso pode ser um fator positivo ou fazer um efeito contrário, dependendo da situação pela qual esteja passando.

Eu não quero mais passar por uma situação de depressão e nem de baixa autoestima, como antigamente, quando eu não me valorizava e tive as energias drenadas por esse sentimento pesado e não afetivo.

Sempre gostei de cultura, de programas festivos com os amigos, mas agora eu entendo que a locomoção não está fácil e tudo fica mais impeditivo, mas não impossível. Preciso encontrar um mote nessa seara da cultura e da arte, para não sucumbir. E quer a alegria volte a povoar os corações. Boa noite.

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